ATUALIDADES:
VESTIBULAR E ENEM


QUESTÕES SOCIAIS:
MIGRAÇÕES

QUANDO O INFERNO SÃO OS OUTROS
Como diferenças culturais, disputa no mercado de trabalho e medo da violência exacerbam a xenofonia


Uma pesquisa de opinião realizada pelo Centro de Pesquisa Pew, em 2015, no auge da crise migratória na Europa, avaliou a aceitação de refugiados em dez países do Velho Continente. O resultado é sintomático do preconceito que aflora cada vez mais na sociedade europeia:
  • Em cinco países, mais de 50% temem perder o emprego ou benefícios sociais para os refugiados;
  • Em oito, mais de 50% acreditam que a entrada de refugiados aumenta a probabilidade de atentados;
  • E, em sete, menos de um terço crê que a diversidade cultural seja benéfica para a nação.

As estatísticas traduzem uma triste realidade, vivenciada na prática por episódios de violência e discursos de ódio: a xenofobia - aversão a pessoas estranhas a seu meio, no geral estrangeiras, como língua, costumes ou religiões diferentes. Essa intolerância floresce com maior intensidade na Europa e nos EUA, mas também ocorre com frequência em todas as partes do globo. 

A xenofobia baseia-se em sentimento de superioridade de uma cultura sobre outra e na crença em esteriótipos. Ela se manifesta mais intensamente em períodos de crises, como a que vivemos atualmente. Hoje, a xenofobia é impulsionada pela onda migratória, pela estagnação econômica que diversos países industrializados atravessam e pelo medo do terrorismo.

HISTÓRIA

A xenofobia é considerada por muitos estudiosos o mais antigo preconceito. Ainda na Grécia antiga, qualquer povo que não falasse o grego era considerado inculto, primitivo e incivilizado. Egípcios, fenícios e persas eram "bárbaros" - antônimo de cidadãos, uma elite de homens adultos nascidos na Grécia e filhos de gregos, grandes proprietários de terras, com boa condição econômica e social. Só estes tinham direitos políticos. Estrangeiros, lavradores, escravos, mulheres e crianças eram coisas. Os bárbaros, capturados em combates, eram transformados em escravos.

Mais recentemente, no século XX, o nazismo de Adolf Hitler pregava a superioridade da "raça ariana" - uma suposta linhagem dos gados e dos vândalos até os alemães modernos. Com o antissemitismo levado ao extremo, Hitler promoveu a perseguição aos judeus que culminou no holocausto, com mais de 6 milhões de mortos. Pouco depois do fim da Segunda Guerra Mundial, na África do Sul, a política do apartheid institucionalizou, entre 1948 e 1990, a discriminação dos negros pelos brancos colonizadores, holandeses e ingleses.

NACIONALISMO

Nesta era da economia globalizada, na qual há livre circulação de capital, produtos e serviços, seria natural pensar que as migrações fossem favorecidas. Mas as fronteiras estão cada vez mais fechada às pessoas. Passados quase dez anos da crise econômica de 2008, o mundo parece entrar num novo período da história: a desglobalização.

O comércio e os investimentos internacionais permaneceram retraídos, e muitos países da União Europeia (UE) ainda estão com o mercado de trabalho estrangulado. A Grécia, um dos países mais afetados, tem uma taxa de desemprego acima de 23%, a maior do bloco. Na Espanha, essa taxa afeta quase 20% da força de trabalho, e na Itália, 14%. Além do desemprego, os rombos das contas públicas levaram governos a aprovar reformas na previdência, aumentado a idade para aposentadoria e reduzindo benefícios sociais. Nessa situação de aperto, os estrangeiros são cada vez menos bem-vindos.

Frustradas, as sociedades começam a questionar os projetos de integração como a UE e voltam a olhar para si mesmas como nações industrializadas, com interesses próprios a defender. Floresce o nacionalismo - sentimento que valoriza a unidade da nação e sua identidade cultural, na língua, nos costumes, nas tradições e na religião. Quando exacerbado, esse nacionalismo enterra o ideal de um mundo em cooperação e passa a prevalecer a competição e as rivalidades nacionais.


POLÍTICAS ANTI-IMIGRATÓRIAS

Em compasso ao crescimento do nacionalismo, em diversos países europeus, a extrema direita vem obtendo expressivos resultados nas urnas, em uma ascensão relacionada à defesa que esses partidos fazem de políticas isolacionistas, protecionistas e contrárias à imigração. Rotular o estrangeiro como inimigo passou a ser uma estratégia cada vez mais usada para justificar os problemas internos e obter ganhos políticos.

Nesse sentido, o Brexit, a saída do Reino Unido da UE, foi a maior expressão política do sentimento anti-imigratório. Mas também é bastante sintomática a postura da Hungria. O primeiro-ministro conservador Viktor Orban decidiu construir uma cerca na fronteira com a Sérvia e aprovou um conjunto de leis anti-imigratórias, que permite a deportação de imigrantes ilegais e à detenção de quem tentar entrar no país ilegalmente. Ao justificar a decisão, o seu governo anunciou que as ações visam a "defender a cultura da Hungria e da Europa", em referência à chegada de refugiados, em sua maioria muçulmanos, a países cristãos - é a xenofobia explicitamente se convertendo em política de Estado.

E os países que têm adotado uma postura mais receptiva ao acolhimento dos refugiados, como a Alemanha, são alvo de fortes críticas. Por pressionar os parceiros da UE a aceitar um sistema de cotas pelo qual cada país teria que receber um número determinado de refugiados, o governo alemão sofreu fortes críticas de países do Leste Europeu, como Hungria, Romênia, República Tcheca e Eslovênia.

Não é só na Europa que a xenofobia é escampada pelos governantes. Nos Estados Unidos (EUA), o presidente Donald Trump foi eleito com uma plataforma explicitamente anti-imigratória, a começar pela promessa de alongar e reforçar o muro na fronteira com o México, numa tentativa de frear o fluxo de imigrantes ilegais. O decreto para a construção da barreira foi assinado logo nas primeiras semanas de seu mandato, embora ainda não esteja claro como esse projeto irá se concretizar.

Em outra claramente xenófoba, Trump assinou um decreto anti-imigração, que veta a entrada de cidadãos de seis países de maioria muçulmano: Síria, Líbia, Iêmen, Irã, Somália e Sudão. Quem chega dessas nações aos EUA só podem permanecer se comprovar alguma "relação autêntica" com uma pessoa ou entidade no país - tem um familiar ou ser contratado por uma empresa norte-americana, por exemplo. O governo dos EUA alegou razões de segurança para barrar pessoas que chegam de nações com "inclinações terroristas".

O decreto havia sido suspenso por um tribunal, que considerou a proibição uma violação à Constituição por discriminar muçulmanos. Mas, em junho, a Supremo Corte do país liberou a proibição de forma temporária até haver uma deliberação definitiva sobre o caso.




ISLAMOFOBIA

O decreto dos EUA à entrada de cidadãos de países de maioria muçulmana como mostra mostra como essa onda xenófoba tem um forte componente islamofóbico, que é o sentimento de repúdio ao islamismo. Desde o ataque ao World Trade Center, em 2001, pelo grupo fundamentalista islâmico Al Qaeda, os muçulmanos passaram a ser associados ao extremismo. Embora essas ações sejam exercidas por uma ínfima parcela de adeptos, que utilizam a religião para obter ganhos políticos e territoriais, a repercussão dos atentados afeta negativamente a expressiva maioria de seguidores, que repudia os atos de violência.

Os mais recentes ataques terroristas na França e na Inglaterra, assumidos pelo grupo extremista Estado Islâmico, agravam ainda mais a islamofobia na Europa. Em um momento em que o continente recebe um grande fluxo de refugiados, a maioria vinda de países islâmicos, como a Síria, crescem os episódios de ódio e violência contra os adeptos da religião, que são estigmatizados como potenciais terroristas.

Nessa difícil convivência, o choque cultural entre os costumes islâmicos e a tradição ocidental é frequente. Na França, por exemplo, onde cerca de 7% da população é muçulmana, desde 2004 as estudantes muçulmanas são proibidas de vestir o hijab, o véu islâmico, nas escolas. A justificativa tem como base o preceito da separação entre Estado e religião, conhecido como secularismo ou laicidade - essa divisão é garantida por lei desde 1905 e é um dos pilares da república francesa. A laicidade das escolas também prevê que adeptos de outras religiões, como judeus, sikhs e cristãos, não utilizem sinais e vestes que manifestem ostensivamente a orientação religiosa. Mas o argumento do Estado secular se converteu em uma estratégia de defesa das tradições francesas contra a crescente influência do islamismo na sociedade.


Em 2010, outra decisão do governo francês acirrou a polêmica: a proibição da burca e do niqab, tipos de véu islâmico que cobrem integralmente o rosto da mulher, em espaços públicos franceses. Deste vez, a lei tinha como objetivo garantir a ordem pública e a segurança nacional. Segundo as autoridades, o uso da burca e do niqab dificulta a identificação das pessoas e a prevenção de atentados. A decisão aumentou o fosso entre os muçulmanos e a sociedade francesa e acentuou a estigmatização do islamismo.

O BEM QUE O IMIGRANTE FAZ

A atual onda xenófoba pode ser considerada uma reação de partes da sociedades em defesa de seus valores culturais e de seus privilégios econômicos. No entanto, muitas nações construíram à identidade a partir da fusão com outras culturas e costumes. E mais: diversos países devem o seu desenvolvimento econômico ao esforço do trabalhar imigrante. Segundo o estudo do McKinsey Global Institute, os migrantes econômicos, que normalmente se deslocam para países mais desenvolvidos do que o de origem, produzem mais de 9% de toda a riqueza gerada no mundo. São quase 7 trilhões de dólares ao ano - 3 trilhões a mais do que se eles tivessem permanecido em sua terra. A maior parte dessa riqueza fica no país de destino.

Na Europa atual, ao contrário do que muitos xenófobos imaginam, o trabalhador imigrante será muito útil. As declinantes taxas de natalidade no continente levam ao envelhecimento populacional - o aumento da proporção de idosos sobre a de jovens. Como consequência, faltará mão de obra no futuro para sustentar o crescimento econômico. Até 2060, haverá no continente apenas dois trabalhadores para cada indivíduo acima de 65 anos, a metade da proporção atual, o que deve sobrecarregar o sistema previdenciário.

Além disso, nos países desenvolvidas há diversos postos de trabalho que, por exigir menor capacitação e pagar menores salários, não conseguem ser preenchidos pelos cidadãos locais. Essas vagas, contudo, são muito valiosas para os migrantes econômicos e os refugiados. Isso sem falar que as ondas migratórias também acabam atraindo profissionais bem preparados e muito talentosos, que rendem grandes dividendos. Os EUA, por exemplo, devem sua liderança tecnológica e científica à chegada de cientistas e pensadores europeus que fugiam do nazismo alemão na II Guerra Mundial. Um deles foi Albert Einstein


ATUALIDADES: VESTIBULAR E ENEM foi retirado do livro GE - ATUALIDADES: VESTIBULAR+ENEM - 2º semestre de 2017, págs. 142, 143, 144 e 145. 

SUGESTÃO

Após a leitura, separamos um pequeno debate entre professores da FACAMP sobre a xenofobia e a crescente extrema-direita na Europa contra imigrantes. As imagens são do YouTube, e o idioma é o português.


Neste vídeo, separamos uma pequena aula sobre atualidade do canal e cursinho Descomplica, que explica a migração na Europa. As imagens também são do YouTube e o idioma é o português.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog