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A seguinte matéria foi escrita por Cecília Ritto, publicada pela revista Veja em 18 de novembro de 2015. Portanto, todos os direitos autorais pertencem exclusivamente à autora e a revista, e não devem ser copiados sem a divulgação de seus nomes.

"NINHO CHEIO"
"Depois dos 'cangurus', jovens formados que não deixam a casa dos pais, agora é a geração perto dos 40 que continua aninhada. Essa turma prefere a vida preto no branco às incertezas do mundo adulto"


"Quem disse que a vida adulta começa quando se deixa a casa dos pais? Já faz tempo que a antes tão valorizada saída do ninho vem sendo postergada por filhotes não tão filhotes assim. Mais precisamente, uma década: foi por volta de 2005 que os demográficos detectaram em boa parte do mundo, no Brasil inclusive, um contingente significativo de jovens com idade entre 25 e 34 anos, aqui chamados de 'cangurus', que continuavam usufruindo a mesma casa, comida e roupa lavada da adolescência. O fenômeno não só continua como se espalhou e agora encosta nos quarentões. Ao contrário de seus antecessores, que em geral permanecem no ninho porque ainda estudam ou buscam rumo na vida, esses 'pós-cangurus' têm, sim, emprego e situação financeira confortável. Mas, desfrutando de liberdades e mordomias, inexistentes na geração de seus pais, não veem por que sair da casa deles. No chamado 'ciclo da vida', esse era o passo para virar gente grande, mas, dizem os estudiosos do fenômeno, o ciclo mudou: a vida adulta agora é bem menor, espremida entre uma juventude e uma velhice muito mais prolongadas."


"Segundo dados colhidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), existe no Brasil 1,7 milhão de pessoas entre 35 e 39 anos morando na casa dos pais - um salto de 23% na proporção desse contingente sobre 2004. Para efeito de comparação, o avanço entre os cangurus originais (mais jovens) no mesmo período foi de 16%, o que indica que os 'pós-cangurus', já bem grandinhos, estão se reproduzindo, digamos, mais rapidamente. 'Contribui para esse fenômeno os pais estarem vivendo mais tempo', diz o demógrafo Reinaldo Gregori, diretor da consultoria Cognatis. Um dos grandes atrativos do lar paterno é o conforto: não precisam se preocupar com trivialidades como almoço, jantar, roupa limpa ou faxina. Outro é a economia - sobre mais para restaurantes e viagens. Tudo isso em clima de liberdade, em lares abertos a amigos e namorados. São esses justamente os mantras recitados pela advogada carioca Qnezia Soares Carvalho, 38 anos, que mora na Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro, com o pai, aposentado, a mãe, funcionária pública, e duas irmãs mais novas. 'Sozinha eu não conseguiria ter o mesmo estilo de vida', diz ela, que no orçamento doméstico só contribui com a compra dos alimentos de baixa caloria indispensáveis à sua dieta. Em compensação, já conheceu Nova York, Miami, Orlando, Buenos Aires e arruma as malas para passear na Europa."


"Um motor para a permanência em casa dos 'pós-cangurus' quase quarentões reside no que a pesquisadora Ana Amélia Camarano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), identifica como uma nova configuração dos ciclos da vida. Em um estudo a ser publicado em breve, intitulado 'Vivendo mais: estamos ficando mais velhos ou mais jovens por mais tempo?', ela mostra que, em consequência das mudanças de hábitos e comportamentos a partir dos anos 1980, hoje em dia a infância e a fase adulta encolheram, enquanto a juventude e a velhice ficaram mais compridas. 'Sair de casa é um marco da vida adulta. Enquadrar-se como jovem por mais tempo contribui para adiar esse passo', diz Ana Amélia. As estatísticas reforçam a tese. Em uma década, a idade médio do homem para se casar foi de 31 para 33 anos. Ela também está adiando a maternidade. Outra pesquisa, feita pelo Ministério da Saúde em 2012, revelou que 30% das brasileiras naquele ano tiveram o primeiro filho depois dos 30, sendo que doze anos antes o percentual era de 22%."


"A carioca Tatiana Carneiro, 37, um dia, quem sabe, engrossará essa tabela. Ela mora com os pais, já viu os irmãos mais velhos sair de casa, mas não abre mão de viajar, ir a bons restaurantes, shows e peças teatrais. 'O meu salário não acompanha todas as coisas que gosto de fazer. Só devo sair da minha casa quando casar, se casar, Já quase aconteceu, mas acabou não dando certo', conta. No lar da funcionário pública Aline Gomes, também 37, que mora com pai, mãe e irmã de 34 em Brasília, quem deu o grito de independência foram os pais: compraram uma chácara perto e de vez em quando vão para lar, tirar uma folga das filhas. 'Não sinto necessidade de ter um canto próprio. Minha situação é ótima', diz Aline."


"Até o século XVII, o tempo social era previsível: as pessoas plantavam, regavam, colhiam e depois começavam tudo de novo. Com a ideia de progresso embutida nas revoluções francesa e industrial, passado e presente, que eram praticamente a mesma coisa, descolaram-se e o futuro virou uma página aberta. Da mesma forma, os ciclos da vida, demarcados desde tempos primitivos pela biologia - infância, puberdade, menstruação, maternidade, menopausa, velhice, morte -, foram se expandindo para incluir fatores como formaturas, noivado e casamento, promoções e aposentadoria. Tais marcos permanecem, mas seu papel de definidores de etapas diluiu-se diante da longevidade do Brasil está na casa dos 71 anos para os homens e 79 anos para as mulheres - e da pulverização dos projetos profissionais. Nesse novo quadro, os ciclos estão sendo redesenhados e começar vida própria deixou de ser premente. 'Antes, a humanidade tinha muita coisa a fazer em pouco tempo. Hoje, o horizonte aumentou', resume André Simões, pesquisador do IBGE."


"Pais do mundo inteiro estão acolhendo filhos adultos em casa. No Japão, o alto custo de morar sozinho vem cultivando uma geração do que se convencionou chamar de 'parasitas' (aliás, eles não ligam nem um pouco). Na Itália e na Espanha, o motivo mais apontado é a redução da atividade econômica e do mercado de trabalho. Nos Estados Unidos, sair de casa para fazer faculdade continua sendo regra, mas boa parte, mal pegou o diploma, volta para os braços dos pais - um fenômeno batizado de 'bumerangue'. Verdade seja dita: é raro o pai - e, principalmente, a mãe - que reclama. 'Adoro que meu filho more comigo. Ele me faz companhia e tem sua própria vida, viaja, dá festas e traz namorada para dormir aqui quando quer. Eu brinco que, se casar e sair, eu é que vou morar com ele', diz Maria Aparecida da Luz, 63, mãe do jornalista paulista Adalberto Resende, 36. Um cenário exatamente oposto ao de vinte anos atrás, quando sair de casa era sinônimo de independência e liberdade. 'Os pais impunham regras rígidas. Quando esses filhos se tornaram pais, procuraram, com a melhor das intensões, fazer o contrário', avalia a filósofa Tania Zangury, autora de Filhos Mimados, Pais Negligenciados. A atitude, segundo ela, trouxe um efeito ruim: 'Filhos que não sentem prazer em enfrentar desafios, despreparados para encarar problemas'. No seu conforto, os 'pós-cangurus' perguntariam: 'Problemas? Que problemas?"


A matéria acima foi retirada da revista Veja, edição 2 452 - Ano 48 - nº 46, págs. 76, 77, 78, 79 e 80. 18 de novembro de 2015. Todos os direitos autorais são reservados exclusivamente à revista Veja e a Editora Abril.


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